Igualdade e Negligência




   Revolução francesa, século das luzes, igualdade, fraternidade e liberdade, acredito que todos hoje em dia estejam bem acostumados com a ideia de que somos todos iguais (...) né?
   Bem, vamos revisitar esse conceito, pois acredito que a gente tá deixando muita coisa pra trás ao falar isso. Ao citarmos a máxima de que todos os seres humanos são iguais, ou, aos que gostam de uma pitada jurídica, que todos o são perante a lei,  o que isso nos garante?
   É um passo contra a noção determinista de que existem certos aspectos morais em humanos que são inerentes aos mesmos, em outras palavras, dizer que todo humano nasce igual é dizer que não há alguém cuja bondade ou maldade transcende à sua origem. (me assusta um pouco a noção de que é necessário explicar isso nos dias de hoje) Mas vamos com calma, considerar que a moralidade não é um traço de nascença, primeiramente, exige considerar que moralidade é, de fato, um traço humano, e que segundo essa lógica, consequentemente, lhe é atribuído ao longo da vida.
   Vamos recapitular detalhes importantes dessa lógica até aqui. Citei duas frases que, primeiramente podem se completar, mas talvez não: "Todo humano nasce igual" é uma máxima aceitável, do aspecto ético, não? Digo, não há um empecilho legislativo, ou qualquer que o seja, na sociedade ocidental atual que impeça a realidade da frase (claro, desconsiderando toda a problemática social que talvez eu aborde mais a frente no texto). Levando isso em consideração, e o fato de que a moralidade (e todos os outros aspectos que lhe garantem personalidade) de alguém é construída ao longo de sua vida, há, de determinada forma, uma discordância com a ideia inicial de que "todos os seres humanos são iguais". Veja, pessoas são diferentes. Grupos sociais são diferentes. Uma sociedade que baseia sua ética e, mais consolidadamente, suas leis, na prerrogativa bruta de que todos os humanos são iguais perante a mesma, é, contraditoriamente, uma sociedade desigual.
   Entretanto, existem paliativos argumentativos para podermos compreender a lógica da igualdade social. Teoricamente é relativamente simples. Um Estado que parte do princípio de que toda a sua sociedade deve ser tratada igualitariamente precisa, efetivamente, sanar as desigualdades presentes nela.
   Ou seja, é uma grande piada de mal gosto dizer que todos os cidadãos tem direito a determinados aparatos (seja a própria justiça, seja o conjunto de direitos atribuídos a um cidadão, educação, saúde, segurança, etc.) se não lhe é atribuído o acesso ao mesmo. Assumir a responsabilidade de afirmar que todos os cidadãos são (ou, à essa altura, merecem ser) iguais, é assumir a responsabilidade de lhe garantir essa igualdade, e movimentos que contradizem isso possuem um nome: Negligência.
   Acredito, inclusive, que não seja errado dizer, a partir disso, que a violência e os problemas sociais que nascem a partir dessa negligência são e dão frutos a mais violência e mais negligência. Um sistema carcerário que apenas encarcera é, além de custoso, inútil. Uma narrativa que contraria a existência de uma saúde ou uma educação pública é incompreensível por parte da lógica de soberania do Estado. Somado a um conjunto de negligências menores, formam uma estrutura ainda maior que negligencia o direito de se viver o espaço, seja ele a cidade, seja ele o país. E isso gera resultados sim. Quando vemos, em média, qual é o perfil humano de um político, vemos que de representação do povo, nele, há muito pouco. A negligência gera governantes que não parecem com a sociedade que os gerou, e os mesmos fazem políticas para aqueles que eles representam, ou seja, políticas estritamente excludentes.
   Percebam o lugar de vocês onde vocês estão, e percebam qual é o lugar em que vocês estão, estudem geografia e se hidratem, acredito que essas sejam as quatro coisas mais fundamentais para formar, além de seres humanos, cidadãos.

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